segunda-feira, 3 de agosto de 2015

EM LEMBRANÇA AO DIA DO CAPOEIRISTA (3 DE AGOSTO)



Excerto do nosso antigo livro "INTELIGÊNCIA ECONÔMICA", onde alertamos para a necessidade vital de sabermos resistir, na mandinga, à (o)pressão dos mangangões do comércio, quando pretendem nos vender quase a pulso suas mercadorias, sem se importarem se temos ou não capacidade de honrar com as futuras prestações de pagamento.


"Quem são esses “vendedores-patrões”, em relação aos quais devemos afirmar ou negar veementemente, sempre que necessário? Vários, dos mais agressivos e arrogantes aos mais ladinos e sutis.
Seja quem for o usurpador ou grileiro, ele sempre tenta invadir nossas cercanias financeiras sem nosso pleno consentimento, e tenta surrupiar nossas patacas na maior facilidade, apelando para vários truques de psicologia. Tratam-nos, na aparência, como magnatas, mas na essência, como escravos. Não raro, usam golpes agressivos daquela capoeira atlética e acrobática do convencimento, como “queixada”, "vingativa", "arrastão", “tesoura”, “chibata”, "coice", "salto mortal", "cabeçada", "ponteira", "esporão", "martelo voador", “voo do morcego” e “armada pulada”.
Por sua vez, quando o “velho oprimido” se atina que também ele tem algum “jus variandi”[1] sobre as ações e reações da sua própria vida, começa a reagir com alguns contragolpes. Sua ideia não é exatamente contra-atacar a “autoridade”, mas defender, nas esquivas, seus próprios interesses e direitos fundamentais, inclusive o de resistir às investidas contra si que impliquem perdas financeiras. Agora, também ele quer “vadiar no terreiro”. E assusta logo o dinheirento, com o seguinte refrão:

Oi me dá meu dinheiro!
Oi me dá meu dinheiro, valentão!
Me dá meu dinheiro, valentão!
Oi que no meu dinheiro
Ninguém põe a mão![2]

Daí em diante, mais inspirado, ele passa a usar aquela capoeira de jogo rasteiro... mais maliciosa... brincalhona... traiçoeira[3]. Começa a se expressar com movimentos como, por exemplo, “pulo do gato”, “bananeira”, “resistência”, “chapéu de couro”, “boca de calça”, “desprezo”, “encruzilhada”, “rolê”, “meia-lua”, “queda de rim”, “aú-fechado” e, principalmente, várias “negativas”. E, cheio de mandinga, vai continuando... assim... fazendo que vai... e não indo... fingindo que fica... e indo... nesse bate-rebate típico da “pretensão resistida”[4] pacificadora. Sua ideia não é derrubar o valentão acrobata, mas é “deixar ele meio zonzo”, atacando no vácuo, até que desista de suado e vá-se embora olhando pra trás. Mas, se antes de sumir, intrigado, o “mangangão” perguntar ao resistente: “menino, quem foi teu mestre?”, este há de lhe responder, todo garboso: “meu mestre foi Consciência!”

Se alguém deixa de comprar um produto por perceber que será prejudicado, e mantém seu dinheiro no bolso, já ganhou o próprio dinheiro que não saiu do bolso, independentemente da pressão aquisitiva contrária. É importante “estudar”, entender, respeitar e até matutar sobre a pressão do poderoso econômico. Mas daí a desrespeitar sua própria expressão ou contrapressão, só para satisfazer a pretensão oposta, vão outros quinhentos."



[1] Latim: direito de variar, de mudar, inclusive o curso de ações alheias.
[2] Estrofe de um antigo canto da capoeira, de autor desconhecido, já no domínio público.
[3] Referência à capoeira de Angola, que, além de ter esses atributos, é famosa também por ser flexível e respeitadora ao espaço um do outro. [“A capoeira é um diálogo de corpos, que eu venço, quando o meu oponente não tem mais respostas para minhas perguntas.” – Mestre Pastinha, autor do livro “Capoeira Angola”.]
[4] Insatisfação da vontade de um a partir da resistência do outro a seus quereres.



3 comentários:

Lírica disse...

Muito interessante esse artigo, samideano.
A gente tem a impressão que as palavras, as frases apresentam o mesmo movimento dessa luta tão charmosa e especial.
Obrigada.

Unknown disse...

Tive oportunidade, quando criança, de viver em meio a capoeiristas. Nessa época, eles eram vistos com maus olhos pelas autoridades. Muitos eram presos por vadiagem, por serem "maus elementos". O que é a vida, hein? A capoeira, para nosso gáudio, ganhou o mundo. Faz parte da nossa cultura! Muitos estrangeiros vêem à Bahia, para beber na fonte, essa luta tão bela. Tornam-se alunos de nossos mestres. Muitos abriam academias em vários países.
Eis, aí, porque me ufano da minha terra natal!
Therea

Josenilton kaj Madragoa disse...

Pois é, amigo! Houve uma época, mais especificamente entre 1890 e 1937, em que a prática da capoeira foi considerada crime, podendo o praticante que era pego em flagrante ser condenado à pena de dois a seis meses de prisão na ilha de Fernando de Noronha.