Excerto do nosso antigo livro
"INTELIGÊNCIA ECONÔMICA", onde alertamos para a necessidade vital de
sabermos resistir, na mandinga, à (o)pressão dos mangangões do comércio, quando
pretendem nos vender quase a pulso suas mercadorias, sem se importarem se temos
ou não capacidade de honrar com as futuras prestações de pagamento.
"Quem são
esses “vendedores-patrões”, em relação aos quais devemos afirmar ou negar
veementemente, sempre que necessário? Vários, dos mais agressivos e arrogantes
aos mais ladinos e sutis.
Seja quem for o
usurpador ou grileiro, ele sempre tenta invadir nossas cercanias financeiras sem nosso
pleno consentimento, e tenta surrupiar nossas patacas na maior facilidade,
apelando para vários truques de psicologia. Tratam-nos, na aparência, como
magnatas, mas na essência, como escravos. Não raro, usam golpes agressivos daquela capoeira atlética e acrobática do convencimento, como “queixada”, "vingativa", "arrastão", “tesoura”, “chibata”, "coice", "salto mortal", "cabeçada", "ponteira", "esporão", "martelo voador", “voo do
morcego” e “armada pulada”.
Por sua vez,
quando o “velho oprimido” se atina que também ele tem algum “jus variandi”[1] sobre as ações e reações da sua própria
vida, começa a reagir com alguns contragolpes. Sua ideia não é exatamente
contra-atacar a “autoridade”, mas defender, nas esquivas, seus próprios
interesses e direitos fundamentais, inclusive o de resistir às investidas
contra si que impliquem perdas financeiras. Agora, também ele quer “vadiar no
terreiro”. E assusta logo o dinheirento, com o seguinte refrão:
Oi me dá meu dinheiro!
Oi me dá meu dinheiro, valentão!
Me dá meu dinheiro, valentão!
Oi que no meu dinheiro
Ninguém põe a mão![2]
Daí em diante,
mais inspirado, ele passa a usar aquela capoeira de jogo rasteiro... mais
maliciosa... brincalhona... traiçoeira[3]. Começa
a se expressar com movimentos como, por exemplo, “pulo do gato”, “bananeira”,
“resistência”, “chapéu de couro”, “boca de calça”, “desprezo”, “encruzilhada”,
“rolê”, “meia-lua”, “queda de rim”, “aú-fechado” e, principalmente, várias
“negativas”. E, cheio de mandinga, vai continuando... assim... fazendo que
vai... e não indo... fingindo que fica... e indo... nesse bate-rebate típico da
“pretensão resistida”[4] pacificadora. Sua ideia não é
derrubar o valentão acrobata, mas é “deixar ele meio zonzo”, atacando no vácuo,
até que desista de suado e vá-se embora olhando pra trás. Mas, se antes de
sumir, intrigado, o “mangangão” perguntar ao resistente: “menino, quem foi
teu mestre?”, este há de lhe responder, todo garboso: “meu mestre foi
Consciência!”
Se alguém deixa
de comprar um produto por perceber que será prejudicado, e mantém seu dinheiro
no bolso, já ganhou o próprio dinheiro que não saiu do bolso, independentemente
da pressão aquisitiva contrária. É importante “estudar”, entender,
respeitar e até matutar sobre a pressão do poderoso econômico. Mas daí a
desrespeitar sua própria expressão ou contrapressão, só para satisfazer a
pretensão oposta, vão outros quinhentos."
[3] Referência à capoeira de Angola, que, além
de ter esses atributos, é famosa também por ser flexível e respeitadora ao
espaço um do outro. [“A capoeira é um diálogo de corpos, que eu venço, quando
o meu oponente não tem mais respostas para minhas perguntas.” – Mestre
Pastinha, autor do livro “Capoeira Angola”.]
3 comentários:
Muito interessante esse artigo, samideano.
A gente tem a impressão que as palavras, as frases apresentam o mesmo movimento dessa luta tão charmosa e especial.
Obrigada.
Tive oportunidade, quando criança, de viver em meio a capoeiristas. Nessa época, eles eram vistos com maus olhos pelas autoridades. Muitos eram presos por vadiagem, por serem "maus elementos". O que é a vida, hein? A capoeira, para nosso gáudio, ganhou o mundo. Faz parte da nossa cultura! Muitos estrangeiros vêem à Bahia, para beber na fonte, essa luta tão bela. Tornam-se alunos de nossos mestres. Muitos abriam academias em vários países.
Eis, aí, porque me ufano da minha terra natal!
Therea
Pois é, amigo! Houve uma época, mais especificamente entre 1890 e 1937, em que a prática da capoeira foi considerada crime, podendo o praticante que era pego em flagrante ser condenado à pena de dois a seis meses de prisão na ilha de Fernando de Noronha.
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